A Vulnerabilidade da Economia Brasileira

 

 charles tang photo 3 so rosto

Autor: Charles Tang

/ Publicado por:  Jornal “Folha de S. Paulo”, Coluna Tendências e Debates,

/ Data: segunda-feira, 27 de outubro de 2008.

 

- Há pouco, a euforia com o surto de crescimento da economia brasileira somada ao descobrimento dos campos de petróleo fazia acreditar que o Brasil estava blindado contra as mazelas que se revelavam na economia mundial. Chegou-se a pensar que seríamos novamente uma ilha de prosperidade em um mundo em recessão, o que, de fato, havia acontecido por breve período durante a fase do “milagre econômico brasileiro” dos anos 70, quando a economia brasileira crescia mais do que a chinesa atual.

Havia muito para o Brasil celebrar. A demanda chinesa fez com que nossa dívida externa fosse quase toda paga e nossas reservas em divisas atingissem a marca de US$ 200 bilhões. A transferência de renda aumentou a inclusão social, e os investimentos decorrentes do aquecimento econômico fizeram crescer a nossa classe média.

Atingimos o grau de investimento e ainda fomos abençoados com o bônus da descoberta de reservas gigantescas de petróleo no pré-sal. A liberação generosa de créditos agrícolas promoveu a ampliação das áreas plantadas e a demanda de um mundo carente de alimentos contribuiria ainda mais para as reservas do país.

Todavia, a falta de um plano para a nação, bem como de um planejamento estratégico de curto, médio e longo prazos, aliada a uma necessária reestruturação da nossa economia, fez com que aproveitássemos pouco – e mal – o período de prosperidade da economia mundial.

Não há como criar uma nação próspera e moderna sem plano e sem planejamento. Deixamos passar a fase de bonança mundial para criar as defesas que poderiam proteger nosso país desta crise financeira que se alastra e se aprofunda a cada dia.

Sem um rumo definido, fomos beneficiados pela economia mundial em ascensão. Agora, estamos esperando que se revele o destino para o qual as ondas negativas nos levarão. O pouco que nosso país tem crescido se deve mais à teimosia do povo empreendedor que a influências do Estado, que consome 40% da riqueza nacional.

Acordamos para a realidade com a velocidade que vimos se evaporar a nossa poupança em ações e a acelerada desvalorização da moeda. Enquanto nações como EUA, China e outras agressivamente adotavam políticas de estímulo econômico com juros baixos e câmbio favorável para fazer frente à recessão mundial, nosso otimismo fez com que agíssemos na contramão do bom-senso econômico.

Diante de uma das mais severas recessões mundiais, aumentamos a taxa de juros, e mantivemos nosso câmbio em situação desfavorável até que as circunstâncias forçaram a desvalorização do real.

Com a nossa desorganização econômica, as reservas de petróleo descobertas serão insuficientes para desenvolver a nação. Convém lembrar que países como Venezuela, Irã, e outros continuam em situação de subdesenvolvimento, apesar das grandes reservas de petróleo. Da mesma maneira, vimos nações se enriquecerem em curto prazo sem grandes reservas de riquezas naturais, como a China, Japão e demais “tigres asiáticos”.

Nada substitui a organização econômica de um país. Mercantilismo, o caminho da riqueza dos “tigres asiáticos” e da China deverá ser o modelo adaptado para o Brasil.

O atual processo de recessão, com a crise sistêmica do setor bancário e da economia global, tem tudo para se transformar em uma profunda e prolongada depressão mundial. E já estamos vendo essa queda contagiar nossas commodities, cuja exportação tanto nos rendeu nesses últimos anos e que iria blindar o Brasil.

O sistema do laissez faire, de Adam Smith, pregado para o mundo como a fórmula sagrada para a prosperidade, ora revela suas limitações. A socialização dos prejuízos de Wall Street e a estatização total, ou parcial, de quase todas as entidades financeiras chocaram a opinião pública norte-americana. A intervenção de governos na economia, mais chegada às teorias do Keynes, e que se aproxima da direção planejada dos “tigres asiáticos” e da China, deve ora ser vista pelo mundo por uma nova ótica. O capitalismo, da forma praticada, deixará de existir.

Agora temos que nos livrar do modelo econômico de pobreza, que sempre abafou nosso crescimento com taxas de juros exorbitantes. O câmbio desfavorável, o sistema de entraves, a velha legislação trabalhista, a falta de plano e planejamento, fazem parte do nosso modelo de pobreza.

Enquanto a China conseguiu promover a inclusão econômica e social de 480 milhões de habitantes em 25 anos, nossos bolsões de miséria se mantêm. E a moeda chinesa, que flutua de acordo com uma cesta de moedas, se manteve estável nesta crise.

 

Autor: Charles Tang - Presidente da Câmara Brasil China